Oi pai, oi Cris, amores.
Hoje, como quase todo santo dia, despertador toca levanto me visto. Subida, metrô, van, trem. Por todos estes caminhos devo passar por umas cinco ou seis mudanças bruscas de temperatura. Vejo milhares de faces que nunca vou me lembrar. Ouço nomes, conversas, bebo café, vomito poluição. O trem tem a temperatura mais baixa. Deve ser pra condicionar os trabalhadores, deixá-los calmos para que não pensem quão tudo aquilo é difícil. Como são maltratados. Como é fétido o rio.Tem lírios na margem. Uma pequena horta e peixes boiando, mortos. Eu, sentado, lendo meu livro da TAZ - Zonas autonômas temporárias -Um tratato sobre anarquias, estudos sobre piratarias e, enfim, utopias. Dou uma pausa em cada estação, preciso saber onde estou. Entra um garoto, camisa com estampa de bichinho - laranja, mochila, tênis bem amarrado. Foi a mãe quem ensinou, imagino. Tem cara de ser bem esperto. Na verdade penso que toda criança deva ser um pequeno gênio (da lâmpada), liberta prá toda a maravilha do mundo. Senta-se no banco ao lado e pacientemente tira da mochila um disc-man, os fios estão todos embaralhados. O processo de arrumação da tralha toda leva uns cinco minutos. Fio plugado, disc-man apoiado na perna frágil com os pés balançando prá frente e prá trás. A escolha entre os dois cd´s é difícil. Qual ele deveria ouvir. Me parecia calmo e creio ter ficado feliz com a escolha. Cd no disc-man. Play. Play. Play. Play. Algo errado e uma expressão de surpresa. Abre a tampinha do compartimento de pilha. Nada. Vazia. Abre a mochila e revira. Outra peça embaralhada com os fios é a caixinha de força. Puxa fio, bufa, tira fio, bufa, enrola, guarda. Não tem lugar para ligar a caixinha! Desespero e monotonia invadem sua face. Olha pro teto. Deus. Novamente se volta pra tampinha do compartimento de pilha, abre, mexe na molinha, tóim, na esperança da mágica acontecer e ele poder viajar com a música. Fecha. Play, play, play, play. Bufa. Teto. DEUS! Bufa. Tira os fones do ouvido, pacientemente guarda o disc-man. Elis Regina canta no rádio do trem. Estridente. Cotovelo no joelho, mão no queixo. Desolado olha pro lado de fora e deve pensar o por que o mundo é tão cruel. Beijos pros dois. Binho
27 dezembro 2006
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Um comentário:
Não me lembrava que havia escrito isto, mas a face do menino veio a tona. Espero que ele ande com pilhas extras e de olhos abertos.
Beijos
Binho
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