05 julho 2006

FEITICEIRA

O comentário era forte. Dona Maria Perna de Pau era uma bruxa daquelas que só o olhar dela já botava medo. Os meninos da redondeza morriam de medo quando ouviam falar dela. Se ela se aborrecesse com alguém, tava ferrado. Por curiosidade eu passava todos os dias após o expediente de trabalho em frente a casa dela. Uma casinha humilde, no fundo de um quintal. Depois de muito tempo comecei a desconfiar de que aquela história era falsa porque eu passava ali há vários meses e nunca me deparei com a tal bruxa. Parecia lenda, coisas de crianças. Verdade seja dita, eu fazia um verdadeiro desafio à minha coragem porque sempre que entrava naquele quarteirão, tremia de medo em dar de encontro com tão sinistra pessoa. Certo dia, vireio o quarteirão despreocupado, nem pensava mais na bruxa. Ao aproximar da frente da casa da Dona Maria, eis que ela surge no portão. Começou caminhar na minha direção. Do joelho para baixo da perna direita era de pau e o pé ficava voltado para dentro. Ela mancava acintosamente para o lado direito. Na mão direita ela carregava uma vara que servia de bengala. Meu corpo ficou todo gelado, pensei em voltar. Diminuí os passos e fui em frente. Ao aproximar-me dela, notei seu rosto amarelado, aspecto doentio. Ela olhou para mim, deu um sorriso lindo, alegre, mostrando a falta de alguns dentes na frente e me desejou um "boa tarde meu filho". Fiquei tão aliviado que respondi alto o cumprimento dela. Parei na calçada e fiquei olhando-a, até que ela virou a esquina, para nunca mais vê-la. A Dona Maria Perna de Pau voltou a ser lenda.